PARABÉNS! LUÍS DE MONTALVOR

Luís de Montalvor, pseudónimo de Luís Filipe da Gama da Silva Ramos, nasceu na Ilha de S. Vicente de Cabo Verde, no dia 31 de Janeiro de 1891 e viveu até 2 de         Março de 1947, dia em que juntamente com a família, o seu carro, talvez por acidente, caiu no rio Tejo.

Veio para Portugal com dois meses de idade. Desde muito novo que começou a escrever em vários jornais.

Durante três anos viveu no Brasil, onde exerceu as funções de secretário da embaixada de Portugal.

Quando regressou a Portugal trazia o projecto de lançar a revista luso-brasileira Orpheu (figura mítica que vai ao mundo dos mortos socorrer a sua mulher, sem nunca poder olhar para trás), e no ano seguinte lança a Centauro. Foi também o fundador da editorial Ática, que deu inicio à publicação sistemática das obras de Fernando Pessoa (1942) e de Mário de Sá-Carneiro (1946).

A revista teve apenas dois números publicados em 1915. Na lista de colaboradores estavam Fernando Pessoa, Sá Carneiro, Almada Negreiros, Raul Leal, Alfredo Guisado, Cortes Rodrigues e dos brasileiros Eduardo Guimarães, Ângelo Rodrigues e Ronald de Carvalho.

A Orpheu representou uma oportunidade, embora efémera, para os jovens poetas que se reuniam no Irmãos Unidos com Fernando Pessoa, onde podiam publicar tudo o que lhes apetecesse, desde escândalos a poesias sem métrica, etc.

É interessante ler parte da introdução de Luís de Montalvor, publicada no nº 1 da revista Orpheu:

– “ A ORPHEU é um exílio de temperamentos de arte que a querem como a um segredo ou tormento. O que é propriamente revista em sua essência de vida e quotidiano, deixa-o de ser ORPHEU, para melhor se engalanar do seu título e propor-se. E propondo-se, vincula o direito de em primeiro lugar se desassemelhar de outros meios, maneiras de formas de realizar arte, tendo por notável nosso volume de Beleza não ser incaracterístico ou fragmentado, como literárias que são essas duas formas de fazer revista ou jornal. A nossa pretensão é formar, em grupo ou ideia, um número escolhido de revelações em pensamento ou arte, que sobre este princípio aristocrático tenham em ORFHEU o seu ideal esotérico e bem nosso de nos sentirmos e conhecermo-nos.”

Fernando Pessoa disse em Novembro de 1935: “Orpheu acabou. Orpheu continua”. E assim foi. Prosseguiu a ruptura com o passado, romântico e simbolista, emergindo uma nova geração que queria a mudança.

Quando publica, no ano seguinte, o primeiro e único número da revista Centauro, da qual é director, Luís de Montalvor escreve:

– “Somos os descendentes do século da Decadência. Onde somos hoje decadentes foram os de outros tempos nossos percursores. Se nos apelidamos de ou nos apelidaram caracteristicamente de decadentes é porque temos um sentido próprio de decadência, sem deixar contudo de poder ser outra coisa. Somos mais propriamente decadentes, não porque isto implique um conjunto fatal de circunstâncias ou um resultado de estádios morais ou sociais, mas mais verdadeiramente porque fizemos e temos um conceito, uma teoria deliberada, e damos um sentido ao pensamento decadente.”

Luís de Montalvor, poeta e ensaísta produziu curta obra. Mas foi um dos nomes mais importantes do modernismo português.

Publicou “Noite de Satan”, “A Caminho” e “Arte Indígena Portuguesa”, em colaboração com Diogo de Macedo. Parte da sua obra poética foi publicada por várias revistas, entre as quais se destacam além da Orpheu e Presença, a Exílio, a Athena e Seara Nova.

Participou como colaborador doutrinário na revista Presença, ao lado de José Bacelar, Delfim Santos, Alberto de Serpa, Raul Leal, José Marinho, Saul Dias, Fausto José, Francisco Bugalho e António Botto.

Fernando Pessoa disse sobre o poeta:
– “ Não nos ilude Luís de Montalvor na expressão essencial dos seus versos: vive num mundo seu, como todos nós; mas vive com vida num mundo seu, ao passo que a maioria, em verso ou prosa, morre o universo que involuntariamente cria.”

Os seus versos foram coligidos num único volume “Livro de poemas”. Postumamente.

Nesta pequena homenagem no dia do seu nascimento, apreciemos o poema:

“Tarde”

Ardente, morna, a tarde que calcina,
como em quadrante a sombra que descora,

morre − baixo relevo que domina −

como um sol que sobre saibros se demora.

Inunda a terra a vaga de ouro: fina

chuva de sonho. Paira, ao longe, e chora

o olhar errado ao sol que já declina

sobre as palmeiras que o deserto implora.
A um zodíaco de fogo a tarde abrasa,

em terra de varão que o olhar esmalta.

− Estagnante plaino de ouro e rosas − vaza
nele a sombra, sem dor, que em nós começa

e galga, sobe, monta e vive e exalta.

E a noite, a grande noite, recomeça!

 

Luís de Montalvor

 

 

José Eduardo Taveira

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