Maria teve um sonho lindo. Tão belo que receou acordar. Sonhara que passeava por jardins cobertos com flores de todas as cores que exalavam perfumes exóticos, onde havia gente feliz a brincar com crianças e um sol tão vivo que apetecia agarrá-lo para aquecer o seu corpo; que saltava à corda e corria gozando a brisa morna que acariciava a sua face jovial; que se banhava sob as águas cristalinas de uma cascata que brotava do Céu; que deitada na relva, olhava as nuvens de várias cores que se divertiam, transformando-se em anjos brincalhões e lhe provocavam sonoras gargalhadas.
São sete e meia e o maldito sino badalou para o levantar. Aquele sonho sugeriu-lhe a liberdade que tanto deseja. Fugir para fruir como as outras pessoas o prazer de passear, de brincar, de amar. Fugir sem destino. Fugir para respirar o ar puro que lhe dê força para viver. Fugir para lado nenhum. Mas fugir! Maria, através da janela do refeitório, apenas pode ver aridez e imundice como limite da sua ambição. Da ambição que as freiras querem que seja a das jovens ali fechadas. Não há um único sinal de auto-estima em cada uma das raparigas. Vestem fardas descoloridas, feitas à medida de ninguém.
Naquele cosmos construído pelas arquitectas designadas pelo Altíssimo para difundirem o bem e a moral, a humildade e a subserviência, é proibido pronunciar as palavras rapaz e homem. Apenas existem seres assexuados que devem ter vergonha dos seus corpos. Será que este conceito se aplica às freiras em relação ao padre de aspecto seboso?
(Continua)
José Eduardo Taveira