COMO FAZER VIR A CHUVA

CHUVA

       “Como ainda estamos na ordem aparente do mundo, fiquemos por momentos com este personagem, sob o seu mui ilustre nome Nasreddin Hodjâ.

Conta-se na Pérsia que um dia, num tempo de seca tenaz, uma delegação foi ter com ele para lhe perguntar se conhecia um meio de mandar vir chuva.

– Claro – disse ele – conheço um.

– Depressa. Diz-nos o que há a fazer.

Nasreddin pediu que lhe trouxessem uma bacia cheia de água, o que foi feito com grande custo. Quando lhe deram a bacia, tirou a roupa e, para espanto de todos, pôs-se a lavá-la tranquilamente.

– Como!? – Exclamaram. – Juntámos toda a água que nos restava e tu serves-te dela para lavar a tua roupa!

– Não vos inquieteis – respondeu Nasreddin – que eu sei muito bem o que estou a fazer.

Levou todo o tempo necessário, a despeito dos insultos e das ameaças. Lavou a roupa com minúcia e depois disse:

– Agora preciso de outra bacia de água.

Os membros da delegação gritaram ainda mais alto. Onde encontrar a segunda bacia? E para quê? Teria ele perdido o juízo?

Nasreddin manteve-se muito calmo e obstinado.

– Sei muito bem o que faço – dizia ele.

Procuraram por toda a parte, espremeram o barro dos poços, até roubaram a água às crianças, mas trouxeram por fim a segunda bacia.

Nasreddin mergulhou nela a sua roupa e enxaguou-a cuidadosamente.

Os outros olhavam, estupidificados. Já não tinham sequer força para gritar.

Finalmente, ele pediu-lhes que o ajudassem a torcer a sua roupa para a escoar bem. Depois levou-a para o seu pátiozinho e pendurou-a numa corda para a pôr a secar.

Quase no mesmo instante formaram-se grossas nuvens que se aproximaram, e a chuva caiu com abundância.

– Aí têm – disse pausadamente Nasreddin. – É sempre o mesmo, quando estendo a roupa.

 

Nota: Este conto está incluído no livro “Tertúlia de Mentirosos” de Jean-Claude Carrière.

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2 respostas a COMO FAZER VIR A CHUVA

  1. jacques miranda diz:

    Amigo Taveira! Curiosíssimo este conto que acabas de postar. Lembra muito as crönicas dos alguns literatos brasileiros, a exemplo da Carlos Heitor Cony e Salomão Schvartzmann. Como é aprazível admirar as semelhanças, irmandades dos textos e das ambientação havidas entre Brasil e Portugal. Parabéns pelo bom trabalho. Boa sorte!
    Assinado Jacques Miranda – http://www.sitiodolivro.pt/pt/autor/jacques-miranda/42757/

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    • José Eduardo Taveira diz:

      Caro Jacques, muito obrigado pelo comentário. De facto as semelhanças culturais são visíveis nestes textos. Tenho mais dois textos, que publicarei oportunamente. Um abraço.

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