O canário…
ANDA POR AÍ UM CERTO CANÁRIO QUE, CANTANDO BEM, NÃO SEI PORQUÊ NÃO ME ALEGRA; O CANÁRIO TEM NOME DE GENTE: É QUALQUER COISA PARECIDA COMO PACHECO.
E o canário, seguro do conforto da sua gaiola de porta aberta, onde nunca falta alpista, água limpa, onde beber e esparramar as penas, para se livrar de possíveis parasitas, ufano de sua lustrosa plumagem, esvoaçou para o poleiro e trinou seus altissonantes gorjeios. Traduzido para linguagem de gente, o gorjeio, (não traduzido à letra), fala de coisas; pessoas, manifestações, conceitos, critica, políticas e, ainda, mitologia grega.
O canário ficou tristinho, quando, no palanque de uma gigantesca manifestação, (a maior de que há memória neste Portugal humilhado), os organizadores cantaram, a plenos pulmões, o hino da Internacional Socialista.
Pois, sabe, não é propriamente (ou apenas) um hino de feição comunista; é sim, mais, o hino que demarca os pobres de todo o mundo dos ricos que os pisam; falando em termos de pessoas, (sabe o que são pessoas?), identifica o pedido de socorro gritado pelos moribundos, no deserto, quando vislumbram nos céus os abutres que aguardam a hora chegada para os devorarem, ou para afugentar os corvos, que se abeiram dos corpos dos já falecidos para lhes devorarem os olhos.
Eu e os meus camaradas, também o cantámos em exercícios militares, pelos montes das Beiras, como maneira de expurgar uma morte estúpida, em terras que não as nossas, ao serviço de conceitos dos gananciosos fascistas que, na época, nos dominavam.
E, (ainda sobre o hino da Internacional Socialista), a melhor maneira, a única, de o silenciar de vez, é arredar das pessoas desta terra a fome, o desemprego, a miséria, a mentira sobre um futuro melhor que nunca chega, (mais parece uma cenoura presa na ponta de uma vara, para fazer correr o burro que puxa a carroça, sem o emprego do chicote), é ter respeito pelos outros, é aniquilar os burlões que, ao serviço dos interesses estrangeiros, nos devoram até ao cerne da alma. É produzir, é construir, é deixar de uma vez por todas o povo viver e ser feliz. E isso, é tudo o que os canários deste País nunca fizeram. Porquê? – Pergunto. – Sim, mas porquê? E a resposta tarda, apenas e unicamente, porque, na verdade, nem os grandes passarões desta pobre Lusitânia a sabem, quanto mais um simples, insignificante, ignorante e absurdo canário.
Vivemos em Democracia, e, a Democracia, para mim, é a montra onde o POVO escolhe os ideários políticos; para a Democracia, são todos iguais, (ou devem ser, num mundo de sãs atitudes). Então, como pode e deve o Soberano POVO escolher? Preterindo o que não deu provas pelo que ainda não teve o privilégio, de receber nas urnas a honra de, pela primeira vez, ser chamado pelo todo de uma maioria eleita por sufrágio universal, para aplicar na prática o seu ideário politico. O processo democrático pode e deve funcionar, através dos resultados eleitorais; mas também pode impor-se nas ruas, sempre que o POVO se veja espoliado dos seus sagrados direitos: o direito ao trabalho com direitos, o direito à justiça, o direito à felicidade, o direito à saúde, o direito à cultura, o direito a uma Pátria livre do esbulho do estrangeiro permitido pelo relapso de quem governa, mantendo-se no poder anos e anos, com recurso às práticas insidiosas do engano, ou de uma alternância que em tudo, parece combinada. Para que todos os princípios democráticos sejam integralmente respeitados, o País dispõe de uma Constituição, e de um Presidente que a jurou cumprir, e que tem o dever de a fazer cumprir, com recurso ao parecer dos restantes órgãos de soberania, sempre que as dúvidas de interpretação eventualmente surjam; ainda que o Presidente seja (pela Constituição), parco em direitos decisórios; o que, de todo, não invalida que, na posse de todas as suas faculdades mentais e da sua inteligência, não tenha o recurso à palavra.
Mas, (se mo perguntarem), e se tudo isso falhar? – Eu respondo, – O POVO continua a ser Soberano! Tem as ruas, tem a Legalidade Revolucionária, pela pura e simples razão que, o POVO é tudo. È a Pátria, e é a Inteligência Colectiva da Pátria, é o Bom Nome da Pátria, é o Trabalho e, implicitamente, a riqueza, é a cultura; e se algo falha em tudo isto, é porque governos inconsequentes e irresponsáveis, (ou eivados de péssimas intenções), lhe negaram um ensino cuidado, pensado para dar ao Todo que é o POVO a qualidade necessária à sua grandeza.
Por tudo isto, (e para enfim terminar este meu desabafo), eu lhe digo, meu amigo Canário: abra as suas asas, saia da sua gaiola dourada onde nada lhe falta, faça-se à vida, vá em busca de emprego nesta época de calamidade nacional, para perceber de uma vez por todas o que custa a vida aos que sofrem! E depois, sim, depois, fale com conhecimento de causa!
José Solá