Raúl Brandão nasceu a 12 de Março de 1867, na Foz do Douro e viveu até 5 de Dezembro de 1930.
Matriculou-se no Curso Superior de Letras. Pouco tempo depois, entra para a Escola do Exército. Paralelamente mantém uma carreira de jornalista e vai publicando extensa obra literária.
Iniciou-se como escritor em 1890, editando uma colectânea de contos naturalistas “Impressões e Paisagens”.
Foi um dos mais entusiastas renovadores do movimento literário. Dirigiu a “Revista de Hoje” em 1895, com Júlio Brandão e D. João de Castro. Teve uma actividade jornalística de grande sucesso.
Conviveu com intelectuais que participavam na “Seara Nova”, tais como Aquilino Ribeiro, Raúl Proença e Jaime Cortesão.
Participou no grupo “Os Insubmissos” e coordenou a revista com o mesmo nome.
Escreveu várias peças, das quais se destacam: “Noite de Natal” em parceria com Júlio Brandão, “O Doido e a Morte”, “O Rei Imaginário”, “O Gebo e a Sombra”. Esta última peça foi adaptada a filme por Manoel de Oliveira, em Paris. É uma tragédia que acusa as desigualdades sociais e a injustiça. A luta dos pobres contra o egoísmo da burguesia.
Em 1917 publicou “Húmus”, considerada uma obra-prima da literatura portuguesa, dedicada a Columbano, do qual era amigo, e que lhe pintara dois retratos.
Raúl Brandão idealizou um projecto literário para a publicação de quatro livros com o título genérico “A História Humilde do Povo Português”. O primeiro volume foi denominado “Os Pescadores”, a seguir “Os Lavradores”, “Os Pastores” e “Os Operários”. Somente um foi publicado.
A obra “As Ilhas Desconhecidas”, surge a pós uma viagem do escritor aos Açores.
Raúl Brandão é considerado o grande modernista português na ficção.
Nesta pequena homenagem, no dia do seu aniversário, alguns excertos do livro “Húmus”:
– “Desde que se cumpram certas cerimónias ou se respeitem certas fórmulas, consegue-se ser ladrão e escrupulosamente honesto – tudo ao mesmo tempo. A honradez deste homem assenta sobre uma primitiva infâmia. O interesse e a religião, a ganância e o escrúpulo, a honra e o interesse, podem viver na mesma casa, separados por tabiques. Agora é a vez da honra – agora é a vez do dinheiro – agora é a vez da religião. Tudo se acomoda, outras coisas heterogéneas se acomodam ainda. Com um bocado de jeito arranja-se-lhes sempre lugar nas almas bem formadas”.
– “Nenhum de nós sabe o que existe e o que não existe. Vivemos de palavras. Vamos até à cova com palavras. Submetem-nos, subjugam-nos. Pesam toneladas, têm a espessura de montanhas. São as palavras que nos contêm, são as palavras que nos conduzem. Mas há momentos em que cada um redobra de proporções, há momentos em que a vida se me afigura iluminada por outra claridade. Há momentos em que cada um grita: – Eu não vivi! eu não vivi! eu não vivi! – Há momentos em que deparamos com outra figura maior, que nos mete medo. A vida é só isto?”
– “Existe uma certa grandeza em repetir todos os dias a mesma coisa. O homem só vive de detalhes e as manias têm uma força enorme: são elas que nos sustentam.
– “Estamos enterrados em convenções até ao pescoço: usamos as mesmas palavras, fazemos os mesmos gestos. A poeira entranhada sufoca-nos. Pega-se. Adere. Há dias em que não distingo estes seres da minha própria alma; há dias em que através das máscaras vejo outras fisionomias, e, sob a impassibilidade, dor; há dias em que o céu e o inferno esperam e desesperam. Pressinto uma vida oculta, a questão é fazê-la vir à supuração”.
José Eduardo Taveira