“…as if biographers were afraid that the work might be diminished by a life that was less than noble.”
A propósito deste irónico texto de Tim Parks em que ele escreve sobre a necessidade que alguns biógrafos e críticos manifestam – à viva força, meter-se na vida de quem escreve. Gossip, dirão alguns , que tem isso que ver com a obra em si? Que tem isso de importante, diria eu, mais uma vez socorrendo-me de um provérbio bem português em que convento rima com o que lá vai dentro.
Quando leio um autor prefiro não o conhecer. O que ele escreve terá alguma coisa que ver com o que ele é, o que aparenta ser, a máscara escolhida, a canção para nos acordar, para nos adormecer,talvez. Mas ele escreve por paixão, só assim será poema, cantam, a escrita dele é o vómito diário, sem o qual não vive, se envenena. o desabafo, o espaço fora do vazio, a expiação. prefiro nem saber que está morto ou vivo, que vive com as ervinhas debaixo do chão ou que morre, se vai morrendo de bicas e tabacos, do tédio desta terra, de si mesmo e do outro. prefiro-o a viver em mim, nas palavras ajuntadas, feira-da-ladra das palavras, velhas novas, coloridas ou cinzentas, escuras ou luminosas. aproveitadas, recicladas, trabalhadas em ouros e marfins ou restos de folha e plástico. Ler é ser só eu a lê-las. Escrever é capturá-las, usá-las, sodomizá-las para paisagens novas que vão rolando, rolando se liquefazendo no íntimo de si per omnia saecula saeculorum, se reinventando para o outro, para dar.